Loucas e más – um relato sobre a convergência de experiências

Loucas e más – um relato sobre a convergência de experiências (Triste, Louca ou Má por Francisco, el Hombre no Festival Móveis Convida 2018).

Um pouquinho de loucura e maldade nunca é demais. E isso tudo fazia sentido para promover a junção de um coral feminino à performance da banda Francisco, El Hombre. É preciso contar alguns meses de história para chegarmos à esta performance das meninas no dia das mães de 2018.

Mas antes, passo a palavra para uma estudante, Anna Gabriela Lorenz, uma das participantes do coral.

Acho que a emoção se inicia na possibilidade do começo, de conhecer, subir ao palco e vivenciar. Ao receber a proposta, o estômago embrulha com luzes estranhas que começam a aparecer e a gente não identifica de cara o que é… quando desde os ensaios ao cantar essa música a energia também transborda, até que no primeiro contato face a face com uma banda que inova a alma e essas luzes se acendem quando entramos no palco, todas tão nervosas e ao mesmo tempo muito confortáveis num momento nosso, de todas as mulheres que são ou estão a se tornar, seus próprios lares por meio da música “Triste, louca ou má” ou mesmo por desavenças da vida. A oportunidade que acende luzes, vozes internas ou externas e abre caminhos para cascata de emoções novas e explosivas como conhecer minha banda favorita e cantar ao lado da mulher que abriu e abre muitos olhos e janelas para novas almas florirem. Uma experiência inacreditável e inesquecível! Muita gratidão envolvida.

A proposta recebida, relatada pela Anna, foi, na verdade, uma consulta. Isso aconteceu no finzinho de março, o coral estava parado e ela ainda não fazia parte. Logo depois fiz a mesma pergunta a uma colega dela, Iacy Coello. Esta, por sua vez, sempre esteve no coral. Por sua proximidade com a professora Rita Mendonça, responsável pelo coral, a consulta foi mais direcionada, provocando o retorno dos ensaios. Ao acaso, naquele mesmo dia, no fim da tarde, encontrei a professora Rita e repeti a consulta. Interjeições positivas, conhecimento da música (“já ensaio ela com um coral só de mulheres”, ela nos revelou) e muita vontade demonstrada. Na semana seguinte (início de abril) o coral estava de volta aos ensaios…

Como chegamos a isso? Comentei com as meninas, não há nada garantido, mas tenho convicção de que tudo vai dar certo. E nisso vem a tal convergência. Vamos aos antecedentes.

  1. Conselheiro do Festival Móveis Convida: há alguns anos o fabio pedroza, baixista do Móveis Coloniais de Acaju, adquiriu o evento. Não consegui me desvencilhar do festival 100% e, este ano (com uma carga de trabalho elevada), não fui mais que um conselheiro (e gostei de ficar só nisso – último ano em que de fato trabalhei foi 2016). Há tempos recomendo ao fabio que o um diferencial do Móveis Convida pudesse ser a oferta de estrutura/condições e até mesmo orçamento para que alguma das atrações fizesse um show conceito, exclusivo. Era isso que eu tinha em mente para o Móveis… mas nunca conseguimos levar adiante pelo acúmulo de tarefas.
  2. Apresentação de fim de semestre do coral do Campus Brasília (IFB-CBRA): ao fim do primeiro semestre letivo de 2017, o coral fez uma apresentação na escola. Foi curto mas arrebatador! Lembro de ver várias colegas chorando tamanha a emoção. Diante disso, o potencial de um coral para encantar plateias não saiu da minha cabeça.
  3. Inspiração no maestro Levino de Alcântara: nos vários estudos sobre a educação, resgatei o maestro! Um dos pilares da educação musical no DF, o criador da Escola de Música de Brasília disse em sua última entrevista que montava corais nas escolas e fazia apresentações dominicais na Torre de TV porque as pessoas precisam ver o que a escola faz para poder ajudá-la. Isso também se manteve em minha cabeça.
  4. Quem tem boca vai pra roda: a melhor coisa de atuar na docência é o aprendizado em sala de aula. Uma estudante, Lélia de Castro, desde o primeiro dia chamou a atenção sobre questões de gênero e me fez refletir muito nos últimos tempos. Uma recompensa foi ela me chamar para orientá-la num conjunto de ações para um projeto. Quem tem boca vai pra roda reuniu conversas, oficina de escrita criativa e outras ações para mulheres. Anna e Iacy, citadas acima, participaram desses eventos. Isso aconteceu no segundo semestre de 2017 e um êxito no papel de orientador foi conseguir juntar alunas do curso técnico em Eventos com alunas do curso superior em Gestão Pública do IFB. Além das reflexões, esse projeto trouxe mais uma questão importante neste histórico… sabe qual foi a música-tema escolhida pelas meninas?

Juntemos tudo isso e temos a convergência! Assim que soube que haveria francisco, el hombre na programação do Móveis Convida, visualizei, com toda a convicção do mundo, um coral formado somente por mulheres cantando junto Triste, Louca ou Má. Perguntei pro fabio se eu poderia acionar aquela ideia de show conceito, mas com uma ação apenas. Ele deu carta branca e logo entrei em contato com Felipe França, produtor da banda. Expliquei a ideia, que logo topou com a condição de que mostrasse um vídeo do coral e garantisse a estrutura para que tudo acontecesse.

Foi-se um tempo entre alguns ensaios do coral e o vídeo que enviamos pra eles. Logo depois a Juliana Strassacapa, vocalista da banda, e a professora Rita estavam em contato. Tudo certo, do ponto de vista musical! Faltava ainda acertar tudo na produção – o que seria fácil, tendo em vista a preocupação do festival com questões de gênero (seja no quantitativo de atrações ou mesmo na equipe).

O resultado não poderia ter sido melhor! Uma performance emocionante com direito a videoclipe produzido como resultado de oficina do próprio festival Móveis Convida. Diante disso tudo, resta também agradecer à banda, coral, festival e à Moviola – responsável pelo clipe.

De minha parte, compartilho vídeo do ensaio realizado na manhã do show! O ponto, pra mim, mais emocionante… um domingo de manhã, dia das mães.

A gente se deu tão bem

A gente se deu tão bem: relato sobre o trabalho coletivo
20 de setembro de 2017

Se não for devagar
Que ao menos seja eterno assim

[mobília em casa] Sobradinho
Mobília em Casa: filme certo na hora errada. Foto: Gui Campos
Posso dizer que vivi um período dos sonhos. Visitei mais de 100 cidades, conheci milhares de pessoas e pude ver a alegria em cada uma delas. Os dias não foram fáceis, mas fazia o que amava. E o melhor, isso fazia sentido pra mim, para o nosso grupo de trabalho e, consequentemente, para essas milhares de pessoas!

Sim, este relato fala sobre a banda Móveis Coloniais de Acaju. Pode ser que você não a conheça, ache esse nome uma das coisas mais esquisitas que ouviu e tampouco interesse-se sobre. Mas adianto, este texto pode ser muito interessante! Inspirei-me em leituras sobre Educação (área à qual apaixono-me cada vez mais), principalmente no seguinte trecho assinado coletivamente pela Escola da Ponte.

Talvez por influência de um cotidiano feito de solidariedade, talvez porque a multiplicidade das interpretações suscite um canto a várias vozes, este texto não poderia deixar de ser coletivo. Se houve quem escrevesse uma folhinha, outros colaboraram com algumas linhas, um olhar, um sorriso de acordo, um silêncio. E, porque o todo é um só, o registro surge encadeado e na primeira pessoa…

Identificação à primeira vista! E, como aqueles filmes da vida que passam num pequeno instante, pude sentir novamente um pouco da emoção de ter participado desse grupo musical. Do sonho, dos planos e da satisfação gerada ao fim de show… que sensação boa era aquela! Sei que talvez nunca a sinta novamente, mas tenho orgulho de ter vivido isso.

Por que o trecho acima me inspirou a escrever?! Admito, acho que o período dos sonhos não compreende toda a história da banda (considerando o período 1998-2016) e nem durante toda a minha jornada  junto ao grupo (2004-2016). É difícil definir o momento, mas talvez seja adequado considerá-lo durante o ciclo que chamarei de C_mpl_te (mais ou menos compreendido durante os anos 2007 e 2011).

O nome do ciclo faz referência direta ao segundo disco. Chegamos a ele porque este foi o período onde buscamos estabelecer um processo real de coletividade: entre nós, entre os agentes de mercado e, principalmente, o público. Nessa época, estávamos tão envolvidos, que era com felicidade que, às vezes, ouvíamos alguém assobiando a melodia da música O Tempo, bem antes mesmo de trabalhar seriamente nela. Às vezes, na saída do ônibus, após 12 horas de viagem, alguém cantava: “a gente se deu tão bem”… e isso trazia um ar otimista.

Tínhamos, ali, um sonho! Viver para a música, por meio de uma relação de alegria com nosso público. A cada encontro, a felicidade reinaria. Isso contagiava, fez com que produzíssemos clipes, viajássemos durante horas desbravando nosso gigante país em busca desses momentos com essas milhares de pessoas. Fosse em Rio Branco (AC) ou em Nova Porteirinha (MG), Santa Maria (RS) ou Campina Grande (PB)…

Amávamos o que fazíamos! Isso rendeu prêmios, mais shows, música em novela, viagens ao exterior, capa de revista, a Revolta do Acaju, novas amizades e um turbilhão de emoções. As contas eram apertadas, mas levávamos a vida. E, nesse período, fosse com um silêncio, um sorriso ou várias ideias ou projetos, sabíamos que todo o grupo estava envolvido. Talvez um instante único em que nove, dez ou 11 pessoas conseguiam assim interagir. E isso contagiava as pessoas ao redor, fossem aquelas que trabalhavam diretamente conosco ou mesmo por parte do público que, mobilizados digitalmente, nos levaram a João Pessoa (PB) ou à vitória no Prêmio Multishow (2010).

Era incrível! E, hoje, digo que essa coletividade, de fato, existiu naquele ciclo. De alguma maneira, posso afirmar que não tivemos a mesma energia nos anos que seguiram até a pausa nas atividades. E, naturalmente, por esta razão, acredito que não estejamos juntos fisicamente agora. Mas, a cada dia, carrego algumas lições desse período. Certamente, são elas que me fazem acreditar numa educação transformadora hoje.